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Especiais Ditadura da beleza

Como os padrões estéticos afetam a saúde e a autoestima das mulheres

A busca incansável pelo belo, pode gerar sérias consequências para a saúde física e mental

29/05/2024 21h48 Atualizada há 1 ano
Por: Redação Fonte: Mariana Fernandes
Foto: Divulgação
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As mulheres estão quase sempre em busca de melhorar a aparência, e isso vem desde a infância. Tentar pertencer ou se encaixar em um perfil que não é o seu, pode ser uma tentativa sem sucesso. A busca incessante pelo corpo ideal pode trazer sérias consequências.

Antes da preocupação estética, a saúde deve ser prioridade. O padrão de beleza imposto pelo mercado pode ser  considerado uma ditadura que asfixia o prazer de viver e prejudica a autoestima. Além disso, é um gatilho para que muitas mulheres desenvolvam transtornos alimentares, ansiedade e depressão.

Juliana Klein, 20, é uma das pessoas que sofreram por causa desse padrão. Ela desenvolveu bulimia. Ainda na escola, ela se considerava diferente das outras meninas por causa do peso acima do que os outros consideravam o ideal. “Eu sempre era excluída dos grupos, era considerada a gordinha engraçada”.

 

Ela diz que as pressões em casa também podem ter ajudado a desencadear o transtorno alimentar. “Quando eu era criança, pedi para minha mãe me colocar na aula de balé, e ela me disse que não era para mim, que balé era coisa de gente magra. Meu pai sempre se alimentou bem, e praticou exercícios, então me sentia pressionada para parecer com eles e não me sentir tão diferente”.

 

Juliana diz que, aos poucos, vomitar virou uma rotina. “Eu comecei a vomitar depois das refeições, duas ou três vezes nas primeiras semanas, depois passou a ser logo depois de comer. Já cheguei a vomitar 15 vezes por dia, doía muito. Eu sentia calafrios, tremores, suava”, recorda.

O tratamento começou logo após seu pai descobrir,  “Os episódios ocorrem uma vez ou outra, ainda é difícil dizer se me aceito do jeito que sou. Mas hoje entendo que meu peso não tem relação com minha saúde, todos os meus exames estão ótimos, sou uma pessoa saudável”, afirma.

A psicóloga Keila Brito diz que o transtorno alimentar começa a partir de um gatilho - bullying nas redes sociais, por exemplo - e é preciso analisar cada caso, mas, em geral, a questão começa na adolescência.

 “Algumas pessoas têm a sensibilidade de saber que é um problema, e muitos são por querer ser aceitos e pertencer a um grupo em que, provavelmente, essa pessoa está inserida, e isso acarreta um prejuízo na saúde mental e física muito grande”.

 

A profissional explica que transtornos como a bulimia podem atingir mulheres e homens, mas são mais frequentes nas meninas. Há uma relação com a autoestima, que tem a ver com a forma que a pessoa se enxerga no mundo. Neste cenário, se o corpo é a única forma de pertencer a algo, é como se a pessoa fosse reduzida a um único ponto. “A autoestima não nasce com a gente, ela é desenvolvida com o tempo. Crianças que não tiveram uma afirmação, pais que não ajudaram a construir isso, vai fragmentar. Nossa cultura, de certa forma, é uma cultura que invalida, então vamos ter uma autoestima um pouco mais frágil. É necessário construir pilares para desenvolver uma autoestima menos enfraquecida”, constata.

 

É preciso entender que cada corpo tem uma natureza, um perfil e tentar modificar isso sempre será um processo doloroso, Keila sugere: “Evitar comparações ajuda muito. É preciso entender que o corpo mais cheinho tem uma filogenia que o define. Não adianta ter um biotipo com algumas curvas mais arredondadas e querer ficar esguia, slim, porque a característica não bate”.

 

Padrão de Beleza

 

O belo pode gerar muitas dúvidas quando analisado por diferentes pessoas, há quem diga que beleza está nos olhos de quem vê. É uma ideia que oferece uma experiência de prazer e satisfação por meio dos sentidos. Mas o que podemos considerar como belo ou não?

 

Pesquisa realizada com mais de 7 mil pessoas pela plataforma de comércio eletrônico Groupon, em cinco países da América Latina, mostrou que 89% das pessoas estão insatisfeitas com a estética do rosto ou do corpo.

 

De acordo com a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica (ISAPS), o Brasil é o país com o maior número de realizações de cirurgias plásticas no mundo. Com aproximadamente 1.5 milhões de cirurgias ao ano, o país ultrapassa os Estados Unidos e o México.

 

O maior incômodo está entre as mulheres. É o que mostra o estudo da Sophia Minds, empresa especializada em análises sobre o universo feminino. Depois de ouvir 3.500 mulheres de todas as regiões do país com idades entre 18 e 60 anos, a pesquisa mostrou que 92% delas se sentem incomodadas com alguma parte do corpo.

 

Mulheres crescem ouvindo como devem se comportar e como manter o corpo em forma. Estão sempre sob a influência de algum padrão, muitas vezes difundido na TV, revistas, desfiles, redes sociais, publicidades e até mesmo por pessoas próximas.

 

Seguir um padrão ou repetir um comportamento com base em outras pessoas, nem sempre é a melhor saída. De acordo com o médico André Moreira, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia, é preciso valorizar a beleza natural de cada pessoa. “Eu sempre fui contra a corrente de padronizar. Cada rosto tem uma proporção, e algumas pessoas consideram uns mais bonitos que outros. Quando eu trato um paciente, eu tento fugir do padronizar. Quando essa padronização acontece, você dificulta o processo de embelezamento”.

 

O dermatologista avalia que é preciso entender os motivos quando alguém busca um procedimento estético no consultório. “O papel do profissional é questionar se tal procedimento vai resolver o problema do paciente, porque, muitas vezes, isso pode ser uma fuga de algum outro ponto mal resolvido”, alerta.

 

No consultório, de 20 pessoas atendidas por dia, 15 são para queixas estéticas. O procedimento mais procurado é a toxina botulínica, conhecida pelo nome comercial botox.

Doutor André orienta que é preciso respeitar o limite de cada corpo. “Eu trabalho sem excessos, acredito que o natural é o verdadeiro belo. É uma mistura de bom senso com técnica”, completa.

 

Moda e a Ditadura

 

Para muita gente, a moda passa uma imagem de glamour, fama e sucesso. No entanto, para outras, os padrões estéticos estabelecidos podem funcionar como uma ditadura da beleza. A indústria da moda é uma referência para muitas mulheres que enxergam nas roupas, maquiagens, modelos e procedimentos estéticos uma forma de se sentir bem.

 

Por trás dos bastidores, o cenário nem sempre tem o glamour das capas de revista. Com as exigências de um perfil magro e alto, a cobrança e pressão além de virem das agências e da indústria, surgem das próprias modelos, que, por vezes, sofrem com transtornos psíquicos e alimentares.

 

A miss Distrito Federal 2019, Gabriela Borges, admite que os padrões da indústria podem gerar sofrimento. Ela recorda que se aceitava bem até os 17 anos, porque se comparava com pessoas comuns. “Quando me interessei pelo mundo da moda, e da beleza, eu comecei  a ver outro tipo de corpo como corpo comum, um corpo mais magro, definido, que fosse mais alongado.  Então, minha realidade se tornou outra, por um momento eu me senti pressionada e não me aceitava como eu era, porque eu queria ser igual às outras”.

 

Nos bastidores e nos camarins, o tratamento muitas vezes é inadequado, chegando a faltar comida e água. “A verdade é que você fica muito distante da família, amigos, e isso te deixa muito solitária. É uma profissão que por detalhes, você é deixada de lado, ou não serve mais pra ser modelo. Não recebe bem, principalmente em alguns lugares no Brasil, e você precisa ter uma rede social bombada. Nos bastidores nós temos casos de estilistas que não querem dar comida ou água para a modelo não criar barriga para as fotos ou desfile”, comenta a modelo.

 

Gabriela avalia que buscar um padrão inalcançável só traz dor e sofrimento, e defende a aceitação. “Eu sou feliz com meu corpo e me aceito hoje, antes não, porque me comparava com pessoas que são totalmente diferentes de mim, e hoje eu aprendi a achar bonito minhas curvas. A minha dica é parar de se comparar”.

 

Um movimento que reage ao padrão imposto “magro e esbelto”  é o chamado plus size, que abre espaço para corpos mais “cheinhos”. As modelos plus size estão ganhando mais espaço a cada dia, incentivando todas as mulheres a não terem vergonha do seu corpo.

 

A modelo e Miss Brasil Plus Size 2011, Bárbara Monteiro, avalia que descobrir o que é considerado como ideal para você, é a chave para não se abater com as críticas. “Nós precisamos encontrar um limite de bem-estar com nós mesmos, se cuidar. Eu me cuido, sou saudável. Não devemos pensar nos extremos, nem ser magra demais, nem ser obesa. Precisamos encontrar o nosso melhor e nosso limite para estar bem”.

 

O autoconhecimento e a aceitação pelo que você é te colocam em uma outra posição no mercado. “Nunca fiquei depressiva por querer ser magra, sempre tive uma boa relação com auto imagem. Acredito que isso está muito dentro da gente, da nossa mente. Eu acredito que cada um tem seu caminho, seu corpo, seu jeito e a gente tem que procurar adaptar nossa vida à gente e não aos outros”, comenta Bárbara.

 

Ela avalia que o plus size conquistou  espaço e mostra que qualquer mulher pode alcançar o que deseja, se aceitando como é. “Ser modelo plus size é ser uma modelo como qualquer outra, só que uma modelo mais livre de rótulos. Uma modelo natural, uma pessoa como qualquer outra, que veio mostrar para sociedade que podemos ser todos representados”, comemora.

 

A moda está em constante evolução, e sempre disponível para atender o mercado e todas as mudanças que acontecem de acordo com cada estação. Os estilos se reinventam a cada dia, e o que é ultrapassado são os julgamentos, a padronização, e a ideia de que somente um biotipo é considerado ideal. Ninguém é igual a ninguém; os vários formatos de corpos, representam a diversidade do ser humano. O diferente é o que há de bonito em cada um. Se aceitar, se amar, e se cuidar são as maneiras mais significativas para descrever o que é belo. Enquanto você não se aceita, o mundo não vai te aceitar.

Solte sua voz, seja verdadeira, seja você.

 

Você é o seu próprio padrão de beleza!

 

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